domingo, março 30, 2014

E quem é que sabe?

Existem momentos e locais em que você alcança a plenitude do seu ser - um cantinho no mundo que faz florescer aquilo que você verdadeiramente trás dentro de si. Tenho uma amiga que encontrou seu verdadeiro eu depois que virou mamãe. E outra que antes era uma estudante tensa de medicina que resolveu largar tudo para seguir seu sonho: a faculdade de cinema. 

Mas acho que muitas vezes desconhecemos essa face que trazemos dentro de nós porque ficamos muito preocupados com o fatores externos - casar porque todos estão casando, manter o emprego que é mais convencional, seguir os caminhos que sempre tivemos dentro da mente como "o caminho certo".

Conheci uma mulher espanhola de quase quarenta anos que viaja o mundo para tirar fotografias. Ela não mora numa cidade específica, realmente mora na estrada, e tem vários livros e revistas lançados com as fotos que tira. Admiro muito as pessoas que tem essa coragem de largar tudo e cair na estrada sem data para voltar para seus países. Ela me contou que tinha sido casada quando tinha uns vinte e poucos anos, mas acabou se separando pouquíssimos anos depois... "Ele era meu namorado da faculdade, quando nos formamos, já era certo que casar era o próximo passo a ser tomado". Na minha inocência (e talvez por eu ter me identificado um pouco com a vida que ela leva) perguntei quando ela pretendia parar de viajar para se estabilizar. E claro que a resposta dela foi um belo "e por que diabos eu faria isso?".

E isso instantaneamente me levou para os momentos em que eu me senti tão culpada por todas as vezes em que não aguentava mais estar na minha cidade e ansiava fortemente pela chegada das minhas viagens. Tem alguma coisa dentro de mim que me faz sentir plena quando estou nessas experiências. Um ladinho de mim toma conta do meu ser de forma que talvez meus próprios amigos não reconhecessem - cada pedacinho do meu corpo e mente de repente viram 100% daquilo que nasceram pra ser. Não tenho a pressão do "dever ser" aqui. E o que é mais interessante: você para pra ver que existem pessoas com vontades tão estranhas quanto as suas - ou até mais.

Encontrei um grupo religioso de americanos que eu JAMAIS diria que são jovens membros de uma igreja protestante. Os conheci num estúdio de tatuagem enquanto um deles estava fazendo - acredite você - dreads no cabelo! Quando fui fazer rafting, conheci um casal bem jovem de dinamarqueses que resolveram dar uma pausa na vida para viajar por um ano pela região oeste da Ásia. Por que? "Não sabemos.. Só escolhemos na doida mesmo."

Hoje é meu último dia no Nepal (ainda vou escrever sobre os dias passados, pois não tive tempo). Tem um nó enorme no meu estômago, pois eu realmente não queria ir embora ainda, mas minhas aulas em Nice começam amanhã, e por isso não vou poder estender minha estadia. Em nenhum momento dessas semanas me senti sozinha. Não dá tempo. Ou você está sempre acompanhado dos amigos da residência, ou - o que é melhor ainda - você está acompanhado de um lado de si que não conhecia antes. 

Tive um crescimento aqui que jamais imaginaria ter. Apesar do pouco tempo, não sei colocar tudo em palavras muito bem. Descobri que a inconstância que enxergam em mim vem do meu constante dilema entre minha curiosidade de mundo, e meu medo de perder a segurança do "estável". Não consigo meter o pé na estrada sem saber que tenho um cantinho seguro com data certa para voltar, mas também não consigo ser feliz, pelo menos por enquanto, fincando meus pés num só lugar - meus amigos e família sabem o quanto eu me torno insuportavelmente mal humorada, né? Sempre achei que estava errada por essa tendência a buscar coisas diferentes, até que conheci pessoas que também são assim. 

O que quero dizer é: sinceramente sinto que não tem fórmula para a felicidade - a gente lê isso em todo canto, né? Mas se sentir livre de verdade para fazer suas próprias escolhas nem sempre é fácil. Sei que as vezes sou injusta com a cidade em que moro, mas é muito difícil se sentir adequada num local onde todos julgam sua vida de acordo com um padrão certo de comportamentos. Casar antes de tal idade. Ter tantos filhos. Fazer uma festa de casamento em tal buffet. Só comer clara de ovo, para #ficargrandeporra - hahaha. 

Nessa viagem me livrei de todos os fragmentos de receios e culpa que senti por não me adequar nas expectativas que os outros tem de mim - claro que sempre nos importamos com a opinião dos outros. Mas parei de me angustiar por não encontrar dentro de mim vontades que algumas pessoas tem desde sempre. Existe um momento em que você se depara com a pergunta "que tipo de mulher eu vou ser?". Aprendemos que temos que ter tudo ao mesmo tempo: a carreira, o marido, o tempo para cuidar da família, o look, as viagens, o carro do ano... Pois eu finalmente entendi que não quero ser essa mulher.

Ah, sei lá, deixa teus instintos te levarem. Eu não sei o que o meu futuro me reserva. Mas e quem é que sabe?